“Só espero que haja a possibilidade de continuar a provar que a poesia tem um lugar nas nossas vidas, nos nossos compromissos, nas nossas lutas diárias”, afirmou a poeta à Lusa.
Ana Paula Tavares afirmou que, desde o momento em que soube da notícia, a primeira coisa que lhe ocorreu foram as mulheres do seu país, Angola: “Aquelas que continuam em silêncio, a lutar pela vida todos os dias, a inventar a vida, a reconstruir essa mesma vida”.
“Não tenho pretensões de falar em nome das mulheres do meu país. Sou uma mulher angolana e essa é a minha função, mas se a minha palavra de alguma maneira puder tocá-las e tocar as instâncias que podem – ou que devem – mudar as coisas é um objetivo que gostava” de alcançar, afirmou a escritora, nascida no Lubango, em 1952.
A escritora, professora e defensora dos direitos das mulheres Ana Paula Tavares tornou-se hoje na primeira mulher angolana a conquistar o Prémio Camões, ao fim de 37 edições deste galardão.
Depois de Pepetela, em 1997, e de Luandino Vieira, em 2006, o júri do Prémio Camões distinguiu hoje Ana Paula Tavares, nascida no Lubango, na província de Huíla, em Angola, há 72 anos (vai cumprir o 73.º aniversário no final deste mês).
À Lusa, a escritora e professora – que já antes fez parte do júri do Prémio Camões – disse que nunca esperou que chegasse este dia, já que esse papel de jurada fez com que tivesse consciência de que “há tanta gente a escrever tão bem” em língua portuguesa.
Questionada sobre como olha para a carreira de mais de 50 anos, agora à luz do Prémio Camões, Ana Paula Tavares respondeu que o seu “encontro é sempre com trabalho”.
“Aquele que mais me satisfaz foi realmente uma longa carreira de professora. A palavra ensinar talvez não seja a mais adequada. Aquele contacto com um universo que não é o nosso. O facto de ter como lema de vida sempre levar para cada aula alguma coisa nova”, explicou a escritora e professora universitária, que se jubilou da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em 2023.
Ana Paula Tavares acrescentou que o ofício do ensino foi “um desafio que prolongou em muito tempo a [sua] carreira profissional”.
“Mesmo hoje quando olho para trás é muito compensador pensar nessas pessoas, algumas delas já são velhas, como eu, porque comecei muito nova. Tenho a experiência de ensinar em Angola e a experiência de ensinar aqui em Portugal […] e em todos esses sítios há esse lado compensador, esse lado do desafio, da interrogação, que nos leva a pensar que este universo da língua portuguesa é um universo realmente rico”, disse a autora, que, ainda assim, disse ter uma grande dívida para com a poesia.
O facto de se ter dedicado tanto a tanto trabalho fez com que muitas vezes não tenha podido “escrever o que gostaria de ter escrito”.
Porque a poesia “exige um tempo que uma pessoa que tem uma atividade profissional, exigente e com muitas horas”, não encontra com facilidade. “Pode ser que agora” consiga, completou.